quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Projeto Peixes Anuais do Pampa

Instituto Pró-Pampa finaliza primeira campanha de coleta do “Projeto Peixes Anuais do Pampa”

Na primeira etapa das amostragens do Projeto Peixes Anuais do Pampa, projeto financiado pela Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza, foram realizadas amostragens em nove municípios da metade sul do estado do Rio Grande do Sul (cerca de 3.000 km rodados) e que resultaram no encontro de 15 espécies de peixes anuais (espécies pertencentes à família Rivulidae). Esse número corresponde a cerca de 60% das espécies hoje conhecidas para o Estado (considerando a literatura existente e dados inéditos dos responsáveis pelo projeto) e demonstra a importância da região como um centro de diversidade dessas peculiares espécies. No Bioma Pampa do Brasil (localizado inteira e exclusivamente no RS) esses peixes estão representados pelos gêneros Austrolebias e Cynopoecilus e a maioria das suas espécies são endêmicas desse território, não sendo encontradas em outros Estados brasileiros, ou são compartilhadas principalmente com o Uruguai e em menor grau com a Argentina.

Vale ressaltar que a maioria das espécies da família Rivulidae se caracteriza por habitar áreas úmidas temporárias como banhados, charcos e áreas de várzea que permanecem secas durante boa parte do ano. Nesse sentido, os peixes anuais se adaptaram a viver nesses ambientes deixando seus ovos enterrados no substrato (em estágio de dormência) até que as condições climáticas e ambientais voltem a propiciar a existência de água em seus habitats. Geralmente no Rio Grande do Sul e demais regiões pampeanas do Uruguai e da Argentina as áreas úmidas temporárias inundam-se no outono e permanecem com água somente até o fim da primavera. No resto do ano as áreas secam completamente!  

Área de campo alagado no município do Chuí, nas várzeas do arroio Chuí.


Devido ao seu peculiar e complexo ciclo de vida e também ao fato das áreas úmidas estarem sendo destruídas a níveis sem precedentes pelo acelerado crescimento populacional e suas demandas e conseqüências (intensificação da urbanização, agricultura, construção de barragens, rodovias, novos empreendimentos e etc...) os peixes anuais são os peixes de água doce mais ameaçados do Rio Grande do Sul (compreendem cerca de 40% das espécies ameaçadas no Estado) e do Brasil.
 
Amostragem em charco temporário com a ocorrência de A. charrua no município de Santa Vitória do Palmar .

Por isso, em função do seu alto grau de ameaça e endemismo, surgiu a necessidade da realização de um projeto de mapeamento das populações remanescentes dessas espécies nas áreas úmidas relictuais do Bioma Pampa brasileiro, para assim auxiliar na adoção de estratégias de conservação e manejo para essas espécies e seus suscetíveis habitats.  Através do segundo edital de 2010 da Fundação O Boticário de Proteção a Natureza o Instituto Pró-Pampa concorreu e foi contemplado com um financiamento para a realização do Projeto Peixes Anuais do Pampa, que terá duração de dois anos e abrangerá 36 municípios do Bioma Pampa no Rio Grande do Sul. Além do inventário e mapeamento das populações de peixes anuais do Pampa o projeto investiga a influência das variáveis físico-químicas da água e outras variáveis ambientais na ocorrência abundância e composição dessa assembléia de peixes.
Os resultados obtidos até então são muito satisfatórios e o relatório técnico parcial apresentado recentemente para a Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza foi aprovado com êxito, já que todas as metas propostas para o período foram concluídas com sucesso, merecendo inclusive elogios por parte dos avaliadores.
Foram registradas 115 populações de 15 diferentes espécies de peixes anuais, das quais algumas são inéditas para o Brasil e outras, provavelmente após detalhada revisão constituirão novas espécies para a ciência. Além disso, foi confirmada a ocorrência de peixes anuais em áreas consideradas prioritárias para a conservação do Bioma Pampa segundo o Ministério do Meio Ambiente (MMA) e outras espécies de distribuição bastante restringida tiveram suas áreas de distribuição ampliadas. Entretanto, nem tudo são flores. Apesar do avanço no conhecimento científico que o projeto tem permitido, constatamos que a maioria das áreas com ocorrência de peixes anuais encontra-se bastante fragmentada e o avanço da fronteira agrícola, especulação imobiliária e a perspectiva de novos empreendimentos na região potencializam a ameaça a essas espécies endêmicas do Pampa.

Portanto, com os resultados obtidos pelo projeto pretendemos fornecer um panorama atualizado sobre a distribuição geográfica e sobre as principais ameaças aos peixes anuais do Bioma Pampa, indicando áreas prioritárias para sua conservação e adoção de estratégias específicas para o manejo de suas populações.
   
Austrolebias wolterstorffi


Texto de Luis Esteban Lanés
Fotos de Matheus Volcan
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